quarta-feira, 16 de junho de 2021

Cansaço vs motivação


 
Estive em regime de teletrabalho híbrido durante 14 meses. Voltamos ao escritório no inicio de junho.

Durante esse tempo, os dias correram mais devagar, acompanhei melhor a minha filha que esteve este tempo todo também em casa e onde ainda ficará até outubro. As atividades da casa e as laborais fundiam-se numa dança que me agradava de início, mas que mais para o fim já me começava a irritar. A mesa de jantar foi mesa de trabalho este tempo todo e a cadeira da sala foi se tornando cada vez mais desconfortável. O telemóvel que a empresa me deu e o computador sempre ligado sufocavam-me um bocado.

Mas a qualidade de vida que tive durante este tempo, bateu todos os desconfortos. O tempo para ir levar a miúda aqui e ali; a disponibilidade de lhe fazer o almoço enquanto víamos uma série; levantar-me 5 minutos antes das 9:00 e chegar ao sofá 5 minutos depois das 18:30; ir fazer unhas na hora de almoço; tratar da roupa entre e-mails e adiantar o jantar cedo, cedinho; tudo isto foi vida! Já para não falar da sensação de segurança contra o raio do vírus invisível. O despertador foi desligado porque acordo cedo por natureza e as noites eram dormidas de seguida. Enfim, o sonho!

Pois que semana e meia depois de voltar a tempo inteiro ao escritório e mesmo depois de uma semana de férias, estou CANSADA! Durmo mal, acordo diversas vezes durante a noite, acordo cedo demais para me levantar, mas tarde demais para tentar voltar a adormecer. 

Quero fazer umas caminhadas, porque preciso mesmo, sinto o corpo mole e com dores aqui e ali, quase que o ouço gritar "mexe-me, porra, estou a atrofiar, preciso de fortalecer estes músculos e olear estas articulações, mulher!" mas a minha mente aproveita a mais pequena desculpa para ficar alapada no sofá… ora está frio, ora está calor, ora estou cansada, ora está vento, ora é tarde, ora é cedo, ora… tudo serve para não fazer a vontade ao corpo que precisa meeeesmo de ser mexido.

Seria de pensar que com o tempo livre que tive em casa, tivesse adquirido algum hábito de me mexer, certo? Errado! Nem adquiri nenhum hábito e pouco mexi o cu! A desculpa mor para este tempo? O medo do covid, o confinamento além das desculpas anteriores, claro…

Eu sei que não devo explicações a ninguém, mas devo a mim própria. E isto não sendo explicação nenhuma, será pelo menos uma gotinha de auto-motivação. Odeio o antes (a logística para sair de casa para caminhar num sítio agradável), mas adoro o durante (caminhadas em conversa ou a ouvir música ou um podcast) e também gosto bastante do depois, não propriamente das dores nas pernas e pés, mas daquela sensação de músculos trabalhados e de dever cumprido. Como acabar com a auto-sabotagem? Essa sim é a pergunta para um milhão de euros!!

sexta-feira, 21 de maio de 2021


Tomar a saúde como garantida é algo que fazemos diariamente e só quando aparece algum problema é que nos damos conta da sorte que temos em nos podermos dar ao luxo de nos preocuparmos com os nossos pequenos defeitos. 
Não agradecemos o suficiente ao nosso corpo por tudo o que ele faz por nós todos os dias, mesmo quando muitas vezes estamos a lutar contra ele.
Esta semana, o corpo do hubby disse-lhe "olha lá, estou um bocado farto que puxes demais por mim, mas tu não me ligas, vais levar com um síndrome vertiginoso que é para aprenderes!". No dia seguinte o meu sogro teve o que pareceu ser um enfarte, mas felizmente acabou por se revelar um problema menor.
É fácil levar o corpo ao limite, exigir mais e mais dele sem lhe mostrar gratidão pelo que nos permite fazer, sem o mimar seja com descanso, seja com massagens, nutri-lo em condições ou treiná-lo para ser mais forte.
Mas depois vêm estes reveses que nos obrigam a parar, a priorizar a saúde em vez de tudo o resto que normalmente vem à frente e, com sorte, uma lição aprendida para ser mais gentil com o nosso corpo. 
É que ele não tem substituto 🤍

 

segunda-feira, 10 de maio de 2021

Esta sou eu


 A do espelho, hoje.

Tem dias que olho para mim e me sinto uma matrafona (tenho mesmo de continuar a renovar o guarda-roupa para o meu corpo atual), mas hoje gostei de me ver. Não sei se tem a ver com a roupa, é muito básica e simplezinha, mas gostei do conjunto final, e principalmente da confiança que vejo no espelho.

A da foto por cima do espelho, há mais de 20 anos.

Esta foto foi tirada num casamento, a roupa que usava foi queimada por mim numa cerimónia simbólica da "queima da gorda" depois de vários quilos perdidos muito à custa uma dose generosa de saúde mental (reconheço agora). Mas o que mais me salta aos olhos na foto é a minha expressão que exala falta de confiança. A foto foi posta ali para eu me lembrar de nunca mais voltar a ser assim (gorda). Na verdade, hoje até peso mais do que na altura, mas a auto-confiança que ganhei ultrapassa tudo. E é verdade, eu nunca mais quero ter aquela expressão. Quanto ao peso, já fiz as pazes com isso.

A da foto ao lado é da minha wannabe 😊.

Foi uma brincadeira que o hubby fez com o Harry que tanto me inspira com a sua música e com a sua filosofia de bem estar na vida. O Treat People With Kindness é sim um modo de estar no mundo e em muito contribuiu para me sentir bem comigo e isso não tem preço.

Às vezes olho para fotos minhas e não me reconheço. Quer dizer, não me lembro de ser assim. Penso que deve ser porque houve muitas fases, demais até, em que não me olhava ao espelho por não gostar de me ver. Por esmiuçar todos os defeitos em vez de olhar para o meu todo e agradecer ao meu corpo a vida que me proporciona. 

Olhar ao espelho com gentileza pelo meu corpo, agradecer às minhas pernas por me permitirem deslocar-me, agradecer aos meus braços por me permitirem abraçar os meus, à minha barriga que deu abrigo à minha melhor companhia, isso ultrapassa as regueifinhas dos braços, a casca de laranja das pernas e as riscas reluzentes da barriga.

E isso deu-me acima de tudo uma paz de espírito imensa. Saber que posso ser feliz neste meu corpo de hoje, não me sentir uma estranha a tentar fugir de um corpo que não me pertence e só me dar permissão de ser feliz quando lá chegar… deixar de pensar assim e aceitar-me realmente como sou, é um passo de gigante!!

quarta-feira, 28 de abril de 2021

Dos pequenos passos...



Precisava de roupa. Mais propriamente de um casaco (preferencialmente de ganga), um casaco de treino (para as caminhadas), um cinto bonito e queria umas calças rasgadas (que os 45 anos são só número no cartão do cidadão).

E fui à Kiabi. À renovada Kiabi do Marshopping. E trouxe de lá exatamente o que queria, da zona dos tamanhos grandes, desta vez sem complexos nenhuns. O meu tamanho anda de momento entre o 46 e o 48, ora justamente no limite máximo dos tamanhos "normais" e no limite mínimo dos tamanhos "plus size". 

Antigamente era impensável passar naquela secção. Era para mim sinónimo de humilhação, de "eu já não sou isso, passa ao lado". Era normalmente, nas poucas lojas que exibiam essa secção, um pequeno canto com um amontoado de roupas normalmente disformes e de cores soturnas, sem o brilho das restantes ditas "normais".

Mas felizmente há lojas que seguem as tendências de body positivity e além de expandirem esse pequeno canto atravancado, enchem-no com peças em tudo semelhantes às mais pequenas tanto em beleza, organização, preços e até alguns manequins plus size. Sem vergonhas, só orgulho.

E porque são as roupas que devem servir no corpo e não o corpo que tem de se espremer dentro delas, veio de lá um casaco de ganga 46, um casaco de treino com forro aveludado XL, um cinto também XL e umas calças rasgadas 48. Tudo com mais elasticidade do que os tamanhos "normais" e super confortáveis.

Porque no final de contas, a etiqueta é minúscula, escondida e não reflete em nada o meu valor. É simplesmente um pequeno pedaço de tecido com um número que já não mede o meu progresso, não me humilha nem me orgulha.

segunda-feira, 19 de abril de 2021

Da nova mindset


Sinto que finalmente a minha mente está a trabalhar em conjunto com o meu corpo e não a lutarem entre si. E sabe tão bem!

Ontem à noite o jantar foi uma bela tábua de petiscos que incluía queijo, salame, ovos de codorniz cozidos, tomate cereja, rolinhos de fiambre, salsicha, morangos, tangerina, pão e umas pinças do mar (o único frito). Soube-nos a todos pela vida. Antigamente este tipo de tábuas incluía maioritariamente fritos e enchidos e nunca estas coisinhas mais leves. Uma bela troca para repetir garantidamente.

Hoje, depois de uma consulta médica, fomos almoçar ao shopping que a filhota já babava por uma sandes da Pans. Pedi a minha preferida, cola zero e troquei as batatas por uma salada, porque simplesmente não me apetecia meter batatas gordurentas e pouco satisfatórias no meu corpo. Foi uma estreia, nunca tinha feito isto e sinceramente adorei. Não me custou nadinha e principalmente não tive aquela discussão silenciosa na minha cabeça entre o é só hoje... e o não, não podes! Simplesmente não me apeteceu e foi absolutamente libertador.

Desta vez, sinto que estou num mindset bem diferente e finalmente mente e corpo a rumar na mesma direção em vez de um contra o outro. Espero que continue assim

sábado, 17 de abril de 2021

Da primeira semana

 


Olha, senti-me bem! Muito bem, mesmo. 

Aumentei ligeiramente o consumo de legumes, tornei os lanches mais saudáveis, troquei o chocolatinho do almoço por um rebuçado de café sem açúcar (eu não tomo café) e mantive o quadradinho de chocolate depois do jantar. 

Fizemos algumas caminhadas em família com puro prazer em vez de obrigação e voltei a ocupar a cabeça com projetos de trabalhos manuais. 

Continuei a respirar fundo mais vezes, a fazer mais pausas mais vezes e a não me deixar interromper mais vezes. 

É um trabalho holístico, melhorar o corpo e a mente como um todo em vez de só o corpo com o sacrifício da saúde mental como aconteceu no passado. 

O número da balança baixou, mas melhor do que isso, sinto-me em paz comigo e com as minhas escolhas. Isso sim, é sucesso ❤️


terça-feira, 13 de abril de 2021

O primeiro dia do resto da minha vida



 Hoje respirei fundo mais vezes. Olhei para dentro de mim mais vezes. Ajustei as costas na cadeira mais vezes e ergui a cabeça mais vezes. Impedi que interrompessem o meu raciocínio mais vezes e fiz pausas mais vezes.

Hoje desde há muito, muito tempo, não comi um único pedaço de chocolate. Não é de todo a minha intenção abolir o chocolate que tanto prazer me dá, mas hoje, em particular, fazia sentido mostrar a mim própria que eu conseguia, se assim o quisesse. E verdade seja dita não me custou nada. 

Hoje o almoço teve muitos legumes e fruta, o lanche foi básico e satisfatório e o jantar foi bem frugal. Tanto que durante a nossa caminhada que se seguiu pensei: comi pouco, tenho fome. Um chá e uma bolacha resolveram o assunto. 

Não é assim que todos os dias vão correr em termos de alimentação, mas quero que sejam mais os dias assim do que de excessos. Não vou abolir absolutamente nada, muito menos o que realmente me dá prazer. Mas vou reduzir. E vou voltar ao básico, ao menos processado. 

A mentalidade do "perdido por cem, perdido por mil" já tinha abandonado há muito, felizmente. É agora vez de ajustar a mentalidade do "é só hoje". Esta era diária... 

Hoje comprei uma balança, mas guardei-a longe de mim. Sei bem a pressão psicológica que a curiosidade de ver o progresso me causa. A minha ideia é pesar-me ao sábado, só para avaliar se estou no bom caminho, o número não é relevante. Caso comece a mexer com a minha cabeça, mudo os hábitos. 

O que mais me arrasou ontem é que eu não estava a contar minimamente ter passado a barreira psicológica dos 3 dígitos. Na minha mente eu estava a ir bem e mantinha-me ali na linha de água, teria até perdido algum peso. Foi uma bela bofetada que apanhei. E não quero apanhar-me mais desprevenida. 

Não quero ficar obcecada pela balança, não vou voltar a prender o meu valor ao número que ela vai mostrar, nem vou pesar-me 2, 3 ou 4 vezes por dia. 

Vou levar um dia de cada vez. Vou respirar mais vezes fundo e erguer mais vezes a cabeça. Vou fazer mais pausas e vou olhar para mim com orgulho mais vezes. 

Este abanão foi forte e mexeu comigo, mas pode muito bem ter sido exatamente o que eu precisava. 


domingo, 11 de abril de 2021

Dia zero?...


 Pesei-me.

E vi algo que nunca imaginei para mim: 3 dígitos.

Eu sei que o número da balança não me define. Eu sei que o número da etiqueta das calças não me define. Eu sei que o espaço que ocupo no sofá não me define.

Eu sei o valor que tenho como mulher, como mãe, como esposa, como filha, como neta, como amiga, como profissional. E nada disso está ligado à minha aparência física.

Eu hoje sei que é impossível odiar-me até me amar, que isso não resolve porra nenhuma, só me diminui perante mim própria.

Eu não me arrependo de ter ganho 35kg depois de ter perdido 30. Esse foi o meu caminho e não seria a pessoa que sou hoje se não o tivesse percorrido passo após passo.

Tornou-me uma pessoa melhor, mais forte, mais independente, mais segura. Hoje não preciso da validação dos outros para me validar a mim mesma.

Mas...

Não posso continuar assim. O peso em excesso vai fazer-me mal, sim. Não à pessoa que me olha de volta no reflexo do espelho, essa sei o valor que tem. Mas vai fazer mal ao peso que os meus pés e pernas têm de carregar e eventualmente vai sobrecarregar o meu coração, ou os meus pulmões.

Eu quero perder peso. Eu preciso de perder peso. Mas nunca mais odiar-me como motivação... onde é que raio eu tinha a cabeça para algum dia ter achado isso uma boa ideia.

Eu quero perder peso porque me amo. Porque isso sim é cuidar de mim.

Eu quero pesar-me e não confundir o meu valor com o número da diaba da balança. Eu quero levantar-me do sofá e não caminhar como uma velha de 80 anos.

Eu não quero entrar no cíclo diabólico das dietas que não resultam e que nos convencem que a culpa é sempre nossa da nossa falta de empenho e de motivação.

Isto é um equilibrismo numa linha muito fina e quebradiça, mas eu tenho de tentar. Por muito difícil que seja manter esse equilíbrio. Não quero é continuar no caminho em que estou neste momento. 

segunda-feira, 22 de março de 2021

Dos hábitos do passado

Hoje eu consigo olhar-me no espelho e não me focar somente nos pontos negativos.

Hoje eu consigo não precisar de validação externa para gostar de mim.

Hoje eu consigo fazer todo o tipo de refeições sem achar que estou a cometer um enorme pecado.

Foi preciso muito tempo, muito investimento próprio, muita desaprendizagem para chegar onde estou hoje.

O meu copo de auto-estima está cheio e hoje eu posso dizer que aprendi a gostar verdadeiramente de mim como um todo.

Mas...

Confesso que de vez em quando as ideias antigas ainda me visitam.

Confesso que às vezes morro de medo do futuro, dos problemas que o meu peso me possa trazer e muitas vezes penso que seria mais fácil e confortável voltar ao infinito ciclo das dietas que eu tão bem conheço (atenção: não é).

Confesso que às vezes fico triste pelo quanto o meu corpo mudou e pelo facto de poucas coisas que tinha me continuar a servir. Tento não ceder à tentação de guardar peças mais pequenas com o intuito de um dia voltar a caber nelas, não faz bem a ninguém isso. 

Confesso que continuo a fazer zero exercício, apesar de saber perfeitamente o bem que faz ao corpo e ainda mais à mente. Sei que continua a ser auto-sabotagem, mas não consigo ter vontade de me mexer seja de que maneira for.

Desaprender todos os hábitos apregoados pela indústria das dietas como "saudáveis" quando tudo o que faziam era deitar-me abaixo e empurrar ainda mais para o fundo a minha auto-estima é um trabalho árduo. Remar contra a maré dessa indústria que movimenta milhões é um trabalho a tempo inteiro. E às vezes apetece-me atirar a toalha ao chão e voltar a "encarneirar" nas dietas. Era mais fácil, de facto.

Mas depois penso em tudo o que passei, o quanto me custou a chegar aqui, ao ponto alto deste amor por mim e sei que não vale a pena voltar a odiar-me para modificar o meu corpo.

É seguir em frente, uns dias melhor e outros dias pior e tentar todos os dias fazer o melhor para mim.

É difícil, mas tenho de continuar comigo no topo das prioridades. 

segunda-feira, 1 de março de 2021

Hoje foi o dia!


 
Despi-me de roupa, preconceitos e mimimi e tirei do roupeiro e das gavetas o que já não me serve. 

E foi muita roupa.

O meu corpo mudou muito ultimamente. Se antes o aumento de peso se refletia praticamente só nas coxas e ancas, agora passou ao tronco e braços. Um pouco por todo o lado na realidade. E as blusas e os casacos foram os que mais se ressentiram. Confesso que o casaco de couro e o de ganga me custaram imenso...

Mas eu não quero guardar coisas porque "ai, um dia, vou caber nesta peça outra vez!". Chega disso!! Eu quero sentir-me bonita e confortável todos os dias, não só daqui a x meses (ou anos) quando o raio do casaco me voltar a servir. Been there, done that! E não funciona!

Ao mesmo tempo encomendei umas coisinhas na Natura, porque nem só de destralhe se faz a vida. Uma pessoa também tem de se mimar, pois então.

Confesso que é um processo que custa e que nem sempre estamos com o espírito certo para fazermos este exercício. Mas é necessário e no final sente-se uma certa leveza, sem dúvida.

domingo, 21 de fevereiro de 2021

Do desperdício e da falta de

 


Não posso deixar me me achar afortunada por passar estes largos meses em casa parcialmente. Faço a minha parte, a minha família também e esperamos por melhores dias.

Mas há dias em que me sinto farta de tudo isto. 

Sinto que este tempo precioso que passo em casa é constantemente desperdiçado. Se antes dizia à boca cheia "ah não faço exercício/meditação/yoga/ler/refeições mais elaboradas porque não tenho tempo", pois que agora tenho tempo e continuo a não o fazer. Ao fim de quase um ano desta slow-living forçada, sinto que desperdicei o que de mais importante tenho: o meu tempo.

Parece que passo o meu tempo a cozinhar ou a pensar em comida, a trabalhar ou simplesmente no sofá a ver séries repetidas ou a fazer scroll no telemóvel. Num rame-rame constante. Quando podia aproveitar este tempo precioso para fazer coisas boas por mim que habitualmente na realidade não tenho tempo. Tempo agora tenho, mas a nuvem negra que paira o dia inteiro sobre todos, parece que me suga a vontade de fazer seja o que for. 

E sinto falta da minha liberdade. Sinto falta da beira-mar, da maresia, da areia fria e das águas gélidas nos pés descalços. Sinto falta de jantar com os meus pais. Sinto falta de ir ao shopping. Sinto falta de querer uma coisa ir dar ali um saltinho a comprar. Sinto falta de planear um fim de semana fora. Sinto falta de ir fazer uma caminhada longe de casa.

Estou farta de ser prisioneira, quando eu devia era dar graças de poder estar protegida nesta bela prisão que é a minha casa. Devia estar agradecida por o inimigo ainda não nos ter batido à porta nem à dos nossos.

Hoje fomos os quatro fazer uma caminhada: ela, ele, eu e minha enorme neura. Cheguei a casa, meti-me no banho e solucei uns bons minutos sozinha. A neura acalmou, mas sinto-me farta à mesma. Farta de não ter a minha liberdade e farta de não aproveitar a sorte que a slow-living me trouxe. 

Amanhã o dia será melhor. 

segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

Da angústia silenciosa


E eis que 10 meses depois, a televisão volta a estar permanentemente nas notícias desta vez com a catástrofe à nossa porta. As notícias cingem-se a um tema que é repetido uma, duas, dez, vinte vezes ao longo de todo o dia. E eu, aninhada na segurança da minha casinha, sinto-me pequenina. Tento encolher-me como que a tentar escapar ao toque de um vírus invisível que não escolhe por idades, classes sociais ou sexo. Vai tudo a eito e sinceramente só por sorte ainda não nos calhou a nós.

Olho para tudo com incredulidade, que rapidamente se torna banal... 
dez mil novos infetados diários há demasiados dias...
filas de ambulâncias à porta das urgências de hospitais...
mais de 150 mortos diários dias a fio...
contentores a acolher corpos à porta de hospitais...
falta de oxigénio... como assim?... o bem mais básico de todos... inacreditável!!
milhares de pessoas sem mortes dignas e longe do abraço dos seus...
ainda mais milhares de pessoas que não se puderam despedir do pai, da mãe, dos avós, dos filhos...
centenas e centenas de trabalhadores exaustos física e psicologicamente...
estamos a um cisco de termos de escolher quem vive e que morre...

E isto à porta de casa. Já não é em Itália, no Brasil ou nos Estados Unidos. É aqui mesmo. À nossa porta! Sempre à espera que nos toque a nós, aos nossos. Por muito cuidado que possamos ter. Ninguém está imune, ninguém sabe a gravidade com que nos possa atingir.

E se me calha a mim? E se eu não conseguir respirar? E se eu tiver de ir para o hospital? E se não houver lugar para mim no hospital? À minha filha? Ao meu marido? Aos meus pais? Aos meus avós?... 

O som de fundo das notícias não é saudável, bem sei, mas é o que é de momento. Espero pacientemente pelo momento em que me passe esta vontade mórbida e me consiga concentrar noutros assuntos.