quarta-feira, 29 de abril de 2020

Do correr dos dias


Tenho-me sentido presa nos meus pensamentos ultimamente.

O recomeço das aulas para a Bia, o fim de mais uma fase crítica e a incerteza de como vão ser as próximas semanas, não me sinto preparada nem à vontade para enfrentar o dia-a-dia lá fora. Resta-me esperar que decidam que pequenos passos podemos dar e rezar para que continuem a pensar na saúde em primeiro lugar.

Preciso de paz de espírito para conseguir pelo menos aproveitar um pouco deste confinamento.

Uma pessoa ia fazer e acontecer, arrumar e limpar a casa de cima a baixo, ler livros, ver séries, fazer exercício, aprender a meditar...
Pois sim... Os dias limitam-se a dar um jeito à casa, fazer de comer, arrumar louça, lavar roupa, sofá, perder tempo em redes sociais tóxicas entre o levanta e senta ao computador para ir fazendo algum trabalho que vá aparecendo. Há dias em que o telefone toca 100 vezes para resolver 50 assuntos diferentes, há dias em que permanece mudo.

E os dias vão passando, uma pessoa chega à noite cansada e ao olhar para o dia parece que não fez nada e sente-se um bocado inútil.

Nestes últimos dias a televisão tem-se mantido o dia todo nas notícias. O ruído de fundo, ainda que baixo, é um burburinho constante de números, mortes, infetados, confinamento, retorno à normalidade... E sim, eu sei que não é saudável e já tinha deixado de o fazer, mas o sentimento de insegurança e de incerteza quanto aos próximos passos a dar leva-me a isto e isola ainda mais o meu pensamento neste assunto. A minha cabeça é agora uma grande bola de preocupação de covid e nem sequer sobra espaço para o self-care e o self-love.

Eu sou uma pessoa do buraco, dou-me bem na minha toca. Só não gosto desta limitação intensa da liberdade e a sensação permanente de perigo invisível em todo o lado antes inofensivo, corrói-me por dentro.

É claro que eu quero poder dar um passeio à beira mar sem a sensação de que estou a infringir a lei. Sabe deus as saudades que eu tenho de ir ao Marshopping só naquela de ir ao cinema e ver lojas. Mas não vejo que daqui para a frente vá dar tanto prazer como até agora.

Não entendo as pessoas que estão mortinhas por voltar à normalidade. Eu estou aterrada pelos primeiros tempos de adaptação. Porque de "normalidade" vai ter muito pouco, não pensem lá que tão cedo vamos andar por todo o lado como dantes. Coisas tão simples como entrar numa loja e experimentar uma peça de roupa por exemplo, ou sentar num café a lanchar. A mim pelo menos vai fazer-me pensar em imensos cenários de perigo.

Por isso, o retorno à normalidade não vai ser flores e borboletas como muitos pensam... Vai é ser uma aprendizagem constante, ter atenção a pormenores que nem nos passavam pela cabeça no pré-covid. Isso ou uma grande vaga de novos casos pela ânsia de respirar liberdade...

quinta-feira, 23 de abril de 2020

Quarenta dias de quarentena


Passaram-se quarenta dias desde o fim do mundo como sempre o conhecemos.

Desculpem lá o pessimismo, mas acho que nunca mais a vida e as relações sociais vão ser como dantes. Primeiro será por medo e depois por hábito. Acredito que a distância individual veio para ficar.

São já quarentena dias de poucos afetos dos mais próximos e mesmo nenhuns de fora da nossa bolha.

São conversas a mais por telefone e a menos presencialmente. Até porque chega a um ponto em que dói menos o telefonema do que o olhar à distância sem poder abraçar ou tocar, ou o simples beijinho da praxe.

São quarenta dias quase 24/7 com a minha filha, mas com muito poucos stresses. Damo-nos bem e respeitamos o tempo uma da outra. Com o hubby, como ele tem passado grande parte dos dias no armazém, os dias acabam por ser mais normais.

São quarenta dias num ritmo mais lento. Contam-se pelos dedos das mãos as vezes que saí de casa para ir trabalhar e o simples pensamento de que isso possa estar a terminar deixa-me numa pilha de nervos. A prova disso é que são 3:20 da manhã e o sono não vem.

Esta incerteza mata qualquer um aos poucos. Gostava de pertencer àquele grupo de pessoas do "depois logo se vê", mas infelizmente faço parte da equipa dos "sofredores por antecipação" e para nós, a incerteza é o maior veneno.

É provavel que o mês de maio vá ser de uma quinzena de férias obrigatórias na empresa, que de férias não vai ter nada porque o hubby vai estar a trabalhar e a filhota com aulas online de manhã e trabalhos de tarde. E convenhamos, estar fechada em casa não é o meu conceito de férias. Mas é um sacrifício que nos foi pedido para evitar o lay-off e não vou ser eu a ovelha ranhosa a por problemas. Uma coisa é garantida: 15 dias de férias em agosto ninguém me tira e se tudo corresse maravilhosamente bem (que não me acredito), uma semana em setembro para ir à Disney considerando falta justificada e não remunerada estão em cima da mesa, foram essas as minhas condições.

Ao stress do confinamento, a Bia tem de lidar ainda com o stress de concluir o 12º ano, preocupar-se com o exame (felizmente só o de português, livrou-se do de história) e da entrada na faculdade. Ela está a lidar com tudo aparentemente bem, mas é claro que mexe com ela. Por mais caseira que uma pessoa seja, ninguém aguenta!

Temos dado a nossa voltinha pelo quarteirão todos os dias, mas começa a saturar, a paisagem não muda, nem o silêncio.

Resta-nos fazer a nossa parte e rezar para que mais uma vez as decisões do governo no fim do mês sejam a pensar principalmente na saúde das pessoas. Sim sei bem que a economia blá-blá-blá, mas aí sim, logo se vê, nem que tenha de se voltar ao tempo de uma sopa ao jantar e de uma sardinha para três, como diz a minha avó, com saúde tudo se resolve.


quarta-feira, 8 de abril de 2020

Não gosto de me sentir assim


Sinto-me inquieta… Odeio este sentimento de incerteza quanto ao futuro próximo.

Quando em setembro fui operada ao pé, sentia-me exatamente assim. Acima de tudo o que eu mais tinha medo na altura era de ter de ir trabalhar sem ainda me sentir completamente recuperada. Aquela incerteza que sentia sempre que tinha de renovar a baixa, tirava-me sempre umas horas de sono.

Agora tenho exatamente o mesmo sentimento. Estou em teletrabalho até ao dia 17 e espero muito sinceramente que o período seja renovado. Não me sinto segura para conviver com pessoas todos os dias.

Pior, estou a sofrer por antecipação pela ínfima hipótese da minha filha ter de ir para a escola em maio. Estou mortinha por saber quais as regras que vão impor às escolas e espero mesmo que o que tenham em conta seja a segurança suprema dos miúdos.

Ela anda no 12º ano, o pior dos anos para este bicho aparecer!! Além do stress todo com o acesso ao ensino superior, só cá faltava cá mais este stress do finzinho de aulas...

A mim a solução parece-me bem simples: continuam com aulas online e nos exames simplesmente deixam de fora as matérias não lecionadas presencialmente. Caramba, mesmo assim são 3 anos de matéria! Não me parece que venha grande mal ao mundo se não meterem o Memorial do Convento no exame nacional!

Quanto aos exames propriamente ditos, obviamente isso só poderia ser ponderado mais perto da altura, mas ou se adiavam para julho ou agosto ou simplesmente se fariam online! Afinal, toda a nossa vida está estagnada e adiada de momento, não é verdade?

Mesmo indo só os alunos do secundário para a escola, logo, reduzindo a população escolar, não é uma situação que me faça sentir confortável. Deixa-me até muito assustada. São miúdos. Fechados em casa há um mês até agora. Querem convívio, querem abraços e brincadeira. Não me parece que fossem respeitar as regras do distanciamento social. Não está na natureza deles!

É chato estar em casa. É. No meu caso, o trabalho quase que parou. A casa está arrumada. As gavetas organizadas. As prateleiras destralhadas. A roupa passada e arrumada. Os almoços e jantares são feitos com amor e a dedicação que antes não tinha. E os dias vão passando, todos iguais. É um sábado interminável!

É chato, mas é confortável. É seguro. E neste momento é assim que me quero sentir: Segura! Eu e os meus.

Hoje não deveríamos estar aqui. A esta hora deveríamos andar perdidos nas ruas de Paris e amanhã iríamos rumar à Disneyland, terra da magia e de sonhos de criança. Esta ameaça invisível adiou-nos um sonho de duas décadas e sinto-me triste por até isso nos ter roubado. Adiei para setembro, este que é o presente de maioridade da minha fofinha, mas já tenho sérias dúvidas que aconteça nessa altura… Esperança...